quarta-feira, março 23, 2011

Obrigada por insistir

Fotografia: by_oldninja

Até o mais seguro dos homens e a mais confiante das mulheres já passaram por um momento de hesitação, por dúvidas enormes e dúvidas mirins, que talvez nem merecessem ser chamadas de dúvidas, de tão pequenas. Vacilos, seria melhor dizer. Devo ir a este jantar, mesmo sabendo que a dona da casa não me conhece bem? Será que tiro o dinheiro do banco e invisto nesta loucura? Devo mandar um e-mail pedindo desculpas pela minha negligência? Nesta hora, precisamos de um empurrãozinho. E é aos empurradores que dedico esta crônica, a todos aqueles que testemunham os titubeios alheios e dizem: vá em frente!

“Obrigada por insistir para que eu pintasse, que eu escrevesse, que eu atuasse, obrigada por perceber em mim um talento que minha autocrítica jamais permitiria que se desenvolvesse.” “Obrigada por insistir para que eu fosse visitar meu pai no hospital, eu não me perdoaria se não o tivesse visto e falado com ele uma última vez, eu não teria ido se continuasse sendo regida apenas pela minha teimosia e orgulho.”

“Obrigada por insistir para que eu conhecesse Veneza, do contrário eu ficaria para sempre fugindo de lugares turísticos e me considerando muito esperta, e com isso teria deixado de conhecer a cidade mais surreal e encantadora que meus olhos já viram.”


“Obrigada por insistir para que eu fizesse o exame, para que eu não fosse covarde diante das minhas fragilidades, só assim pude descobrir o que trago no corpo para tratá-lo a tempo. Não fosse por você, eu teria deixado este caroço crescer no meu pescoço e me engolir com medo e tudo.”

“Obrigada por insistir para eu voltar pra você, para eu deixar de ser adolescente e aceitar uma vida a dois, uma família, uma serenidade que eu não suspeitava. Eu não sabia que amava tanto você e que havia lhe dado boas pistas sobre isso, como é que você soube antes de mim?”

“Obrigada por insistir para que eu deixasse você, para que eu fosse seguir minha vida, obrigada pela sua confiança de que seríamos melhores amigos do que amantes, eu estava presa a uma condição social que eu pensava que me favorecia, mas nada me favorece mais do que esta liberdade para a qual você, que me conhece melhor do que eu mesma, apresentou-me como saída.”

“Obrigada por insistir para que eu não fosse àquela festa, eu não teria agüentado ver os dois juntos, eu não teria aturado, eu não evitaria outro escândalo, obrigada por ficar segurando minha mão e ter trancado minha porta.”

“Obrigada por insistir para eu cortar o cabelo, obrigada por insistir para eu dançar com você, obrigada por insistir para eu voltar a estudar, obrigada por insistir para eu não tirar o bebê, obrigada por insistir para eu fazer aquele teste, obrigada por insistir para eu me tratar.”

Em tempos em que quase ninguém se olha nos olhos, em que a maioria das pessoas pouco se interessa pelo que não lhe diz respeito, só mesmo agradecendo àqueles que percebem nossas descrenças, indecisões, suspeitas, tudo o que nos paralisa, e gastam um pouco da sua energia conosco, insistindo.

Martha Medeiros

sexta-feira, março 18, 2011

domingo, março 06, 2011

Cisne Negro - O Cisne de Freud

Freud abriu territórios. Incentivou voos. O passado estimula fantasias, traz seus mitos e faz olhar o universo com variadas interpretações.

A história do filme é simples. Nina (Natalie Portman) é uma bailarina que ganha o papel principal na peça “O Lago dos Cisnes”. Na história, uma princesa que se transforma em um cisne branco e precisa do amor sincero de um príncipe para retornar à vida humana. O príncipe, porém, se enfeitiça pelo Cisne Negro, que apesar de dissimulado apresenta o poder da sedução. O Cisne Branco se suicida diante do fato. É a morte do amor idealizado.

O filme trata com genialidade a questão da loucura, do prazer e das paixões. Tudo ao mesmo tempo. A mensagem que o filme me passou foi de que a era das perfeições uma hora chega ao fim. Não adianta sermos perfeitos sem ter paixão por aquilo que se faz.

Entre coisas que destaco, a fotografia é uma delas, ela é densa, e abusa de maneira fantástica das sombras e da luz para dar efeitos chiaroscuros e de tensão. A Trilha sonora é suave que não nos faz esquecer nem por um momento que o ambiente é a dança, a musica, a arte o balé. Referencias e metáforas inteligentes num roteiro que mescla o obvio e o velado, da maneira que tem que ser. Afinal todos conhecem a historia, desde o começo e é obvio a comparação do conflito interno de nina com a história do lago dos cisnes por tanto o final tinha q ser sim obvio e previsível. No entanto não é no suspense que o filme se faz é sim na narrativa na forma que expressa com confusão cortes rápidos e por horas imperceptíveis, ou por vezes bruscos, com a câmera tremida e vista de ângulos alternativos, ou mesmo algumas vezes que os atores parecem olhar pra tela, tudo isso nos faz viver o terror e a luta interna de nina. Ela é uma errante que tem consciência q tem um lado ruim, que tem medo do q pode ser capaz de fazer se se deixar relaxar, se experimentar ser um de seus vários eus.

O Olhar dela é perfeito. A cada olhar dela você entra no seu mundo de perturbação e confusão.

Freud teria enlouquecido ao ver a forma que o diretor trabalhou com os reflexos, espelhos e ate mesmo ao final (quem já viu sabe) com a luta no espelho quebrado. É uma sutileza incrível e beirando a perfeição.

Impactante, inquietante e especialmente envolvente. Difícil esquecer um filme desses tão belo!
O filme incentiva mergulhos interiores, vôos sem fronteiras, travessias infinitas.
Quem tem essa sua sensibilidade não segura a emoção porque compreende a vastidão da alma humana.

Como diz Nina (Natalie Portman) nos últimos segundo do filme:
(...) foi perfeito (...)